quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Roupas no varal. Crônica por Edna Costa.

Como a menina gostava de olhar as roupas brancas e coloridas nos varais! Esvoaçando ao vento, lembravam um balé mudo e mal coordenado. Achava que se o vento fosse muito forte as roupas sairiam, uma a uma, voando pelo céu e que desapareceriam para sempre no infinito.

Olhando a ceroula do avô (que todos da casa temiam e respeitavam) com a braguilha aberta, imaginou seu ar envergonhado se deparasse com tal cena. Até no varal ele demonstrava sua severidade pois as pernas da ceroula ao serem levadas pelo vento, chicoteavam o camisolão branco da avó. Sentiu um arrepio ao lembrar das surras que o avô aplicava naquele que ousasse desobedecê-lo. Até de bengala ela e seus irmãos já tinham apanhado e como doía!

Olhou com ternura para o vestido da mãe, uma mulher que apesar da pobreza e do trabalho pesado, ainda conservava um pouco da beleza de sua juventude. Ela tinha a pele branca como a neve, cabelos castanhos claros encaracolados e corava com facilidade. Quase nunca reclamava e se reclamasse, iria adiantar alguma coisa? Nos dias que havia fartura a mãe cantarolava alto, com a voz cristalina que fazia a menina sorrir e sentir-se feliz.

Em seguida pousou os olhinhos espertos no macacão de serviço do pai, que a mãe lavava, esfregava, esfregava e nunca ficava limpo de tudo. Pensou com tristeza que apesar dele ser um homem inteligente, trabalhador e bom, nunca sairia daquela vida de sacrifícios. Parecia trazer essa sina estampada no rosto sereno e melancólico. Não era um lutador e sim um sonhador. Ia à igreja protestante todo final de semana e, levava a famíla junto para que todos partilhassem sua fé. A menina não gostava de ir porque sentia medo da gritaria que se formava nos finais do culto. Mas não tinha escolha e ia resignada.

As roupas da menina, das irmãs e dos irmãos eram quase todas coloridas, mas ficavam sempre encardidas das brincadeiras no chão de terra batida, das estrepolias nas árvores, das corridas na beira do córrego (eram proibidos de brincar lá, mas iam mesmo assim), de rolar pelo chão com o cachorro chamado Peri e de correr debaixo da chuva, batendo o pé nas poças d'água, que respingavam lama por todo lado e, que sempre acabavam em castigo por desobediência.

Ah! como era bom ser criança! Corria pelo meio de tanto colorido, passando as mãozinhas inocentemente pelas roupas até que a mãe vinha e ralhava com ela. A menina obediente ia saindo de mansinho mas de longe divagava, olhando as roupas balançando no varal.

Nenhum comentário: