quinta-feira, 23 de outubro de 2008

E ainda tem gente que reclama! Crônica por Edna Costa. 02.02.2005.

Hoje vou falar dos mendigos que vivem nas estações de trens e outros lugares públicos. Eles estão lá todos os dias e noites. Na primavera, verão, outono e inverno, que aliás, para eles deve ser a pior época do ano. Sempre nos mesmos lugares durante 24 horas. Conversa jogada fora e olhares perdidos no nada perambulam para lá e para cá como uma procissão macabra.

Sem casa, sem família, sem amor e sem futuro, vivem a mesmice dos dias vazios e iguais. Seguem uma rotina de horror. Sem cama, dormem no chão duro e frio ou nos bancos das praças públicas; sem mesa e cadeiras sentam-se nas beiradas das divisões de vidro das plataformas do metrô ou nos degraus de cimento das igrejas e comem com as mãos o que conseguem da caridade dos que passam.

Driblam os seguranças para poder usar os banheiros públicos - que normalmente são bem limpos - e quando pegos, são escorraçados como cães. Cheiram mal e apesar de normalmente não molestarem ninguém fisicamente, incomodam com seus palavrões, suas presenças sujas e maltrapilhas, nos causando medo e insegurança.

Ainda terão esperancas para o futuro? Será que vivem de lembranças do passado? Ou vegetam somente no presente, sentindo-se como presos no corredor da morte, a espera do desenlace final? Não podemos julgá-los por não sabermos a razão pela qual transformaram-se em fantoches do destino. Atrevo-me a arriscar um palpite de que a primeira coisa que perderam na vida foi a fé em Deus.

Mas eles nos fazem pensar. Pensar em como somos felizes em sermos perfeitos, termos uma casa, emprego, saúde, uma família com quem podemos sentar a mesa para uma refeição decente, e amigos sinceros com quem podemos dividir nossos sonhos. E tem gente que ao invés de agradecer pelo que tem de bom, ainda reclama da vida!

sábado, 11 de outubro de 2008

DR. ZEN? Cronica por Edna Costa. 04.09.2005.

Já passei dos cinquenta e digo isso com um misto de orgulho e apreensão. Orgulho por estar com aparência de cinquenta e esses anos mesmo que tenho e, apreensão porque toda vez que vou ao médico, ele acha alguma coisa errada comigo. Às vezes, eu só vou lá para "fazer manutenção" e, acabo saindo com a impressão que tenho os dias contados. Assim, resolvi trocar de doutor.

Semana passada fui a um clínico chinês, indicado por uma amiga. Na recepção do consultório já senti um mal estar pela frieza do ambiente. A moça que atendia, combinava perfeitamente com o local: educada e impessoal demais! Depois de preenchida a ficha médica, na qual ela fez mil perguntas, sem ao menos olhar no meu rosto, sentei-me numa poltrona de canto e, fingi estar folheando uma revista enquanto passava os olhos - disfarçadamente - pelo ambiente.

Notei que as outras pessoas faziam o mesmo e, me segurei para não rir. Que saudades dos tempos em que os consultórios não tinham tanto luxo mas tinham mais calor humano! A gente sempre engatava uma prosinha com outro paciente e, dali muitas vezes surgiam confidências que resultavam numa consulta à parte, com trocas de informações sobre doenças, remédios e quiçá, uma nova amizade. Se nunca viveu uma situação asssim, você provavelmente tem menos de vinte anos.

Entrei para a consulta e achei o consultório idêntico à sala de espera no quesito frieza. O doutor, já com minha ficha na mão, cumprimentou-me com uma leve reverência, cruzou os braços e ficou me olhando. Pensei que ele fosse me fazer perguntas mas, qual o que, ele ficou na posição "fiscal de vistoria". Nervosa, comecei contar tudo o que me afligia. Falei sobre minha coluna, meu ombro, minha insônia, que tenho cristais no joelho (chic, né gente?) e sei lá o que mais.

Até hoje eu não sei se o chinês era surdo e minha amiga esqueceu de me avisar, se ele desligou-se de tudo e entrou em alfa ou se ficou naquele estado zen oriental...ZEN palavras. Quando terminei de despejar tudo que tinha direito, ele continuou na mesma posição e não emitiu nenhum som. O silêncio era tal, que podia-se ouvir a respiração de ambos. Senti-me envergonhada e solitária no meu ocidentalismo.

Fiquei aliviada quando ele finalmante descruzou os braços, e começou escrever na ficha. Depois de um tempo, que para mim foi uma eternidade, estendeu-me uma receita, levantou-se com um meio sorriso no rosto, soltou um som quase inaudível (seria um até logo?) e abrindo a porta indicou-me a saída. Inacreditável! Saí de lá ZEN entender nada e tomei duas decisões.

Primeira: da próxima vez que precisar de médico vou procurar um geriatra ocidental e me informar melhor sobre ele.

Segunda: Vou ficar um tempo ZEN falar com minha amiga. Talvez o necessário para passar a gana que tenho de enforcá-la!