domingo, 17 de agosto de 2008

A moça da janela! Parte III. Crônica por Edna Costa. 08/03/2008.

Ela, que sonhou ser feliz, casou com o homem errado. Ainda machucada pela vida aceitou conforto material, mas viveu subjugada pelo marido sofrendo calada por quase trinta anos! Permitiu isso tudo achando que deveria agradar, sempre, todos à sua volta, para ser amada de verdade.

Tudo aconteceu como o roteiro de um filme, com final previsível. Acordar cedo para preparar café, chamar um a um para usar o banheiro sem confusão. Fazer com que tudo desse certo nessa primeira refeição e em seguida, levar as crianças para a escola. Na volta, parar no supermercado e no banco.

Chegar em casa já atrasada, lavar a louça, arrumar camas, botar a roupa na máquina de lavar e começar o almoço. De novo, pia cheia de louça, fogão espirrado, mesa colocada e olho no relógio. Ainda falta molhar as plantas, tratar do canário e do peixe (que tem muita pena de ver trancados em espaços tão mínimos, mas aceita por amor aos filhos, que só mais tarde entenderão o que é tirar um bicho da natureza) e dar uma geral na casa.

Sair atrasada para pegar a criançada, achar que todos os faróis estão conspirando contra sua corrida e, chegando perto da escola, claro, não achar nenhuma vaga para estacionar. Coração acelerado, rosto afogueado e os meninos finalmente acomodados, volta para casa revendo mentalmente a rotina do dia.

Na volta, algazarra e gritaria atrapalhando sua concentração para dirigir. Deveria ser permitido às mães colocar mordaças nos anjinhos, para poder praticar direção segura. Pensando bem, depois de receber um caderno voador na cabeça, pensa que sim, deveria poder amarrar as mãos dos fofos, também.

Todos satisfeitos, hora da lição e enfim, um pouco de calmaria. Enquanto arruma tudo na cozinha, já pensa no que servir para o jantar. Duas horas! Tempo de levar todos para o inglês (ou natação, judô, etc), quem sabe, passar rápido na casa da mãe ou da sogra e lá se vai mais um dia atribulado.

Quando chega a noite e todos já estão na cama, arrumar tudo de novo e organizar as coisas para o próximo dia. Cansaço batendo bravo e o marido, sem as sutilezas do tempo de noivado, avança em busca de alívio para as tensões do dia. Fingimento, maneira triste de celebrar o dito amor.

Deitada, relembra os sonhos de juventude e seu grande amor perdido. Sente-se triste e chora pela vida que não viveu. Fará isso muitas vezes. Pensa que pelo menos tem os filhos que são presentes de Deus em sua vida e que fazem seus dias ficarem iluminados, quando escuta seus risos e falatório.

Hoje, quase chegando aos sessenta anos, está divorciada e em paz. Já viveu muitos dramas, sustos e alegrias. Nos dias felizes, canta e gargalha alto. Nos dias de tristeza, reza, acreditando em milagres e sonhando um futuro melhor. Como será a velhice da sonhadora moça da janela, agora uma senhora?

Imagino que será como foi a vida toda. Será feita de encontros e desencontros, em uma esquina qualquer do mundo. Feita de esperanças e crença, de que tudo pode ser do tamanho de seus sonhos, porque quando se tem fé, os sonhos nunca terminam.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

A moça da janela. Parte II. Crônica por Edna Costa. Abril/04/2007.

Numa noite enluarada e silenciosa, a moça da janela caminhou até o topo de uma ladeira que havia perto de sua casa. A seus pés, as luzes faiscantes da cidade confundiam-se com as estrelas que coalhavam o céu. A lua clara e majestosa projetava sombras ameaçadoras, mas ela não sentia medo,

Sentia sim, um grito parado na garganta e uma vontade imensa de esquecer tudo por que passara. Lembranças vieram à tona fazendo-a chorar copiosamente. Naquele momento, decidiu que homem nenhum merecia sua dor e que já era hora de ser feliz novamente.

Resolveu ceder aos galanteios do rapaz que trabalhava numa firma, para a qual ela prestava serviços. Contrariando sua vontade, ele, assim que pôde, foi à sua casa falar com o severo pai, que a repreendeu por nem bem ter terminado um noivado e já estar namorando outro rapaz. Acabaria mal falada, sentenciou. A moça sentiu o peso de ser mulher, numa época em que os homens, ao contrário delas, tudo podiam.

Por mais que se esforçasse, ela não conseguia mais sentir amor verdadeiro em seu coração. Havia apenas ternura, amizade e gratidão, por essa nova pessoa que a estava amparando nesse momento difícil da vida. Tinha dúvidas se apenas isso serviria de base para uma vida inteira, mas ainda ferida pelos acontecimentos, deixou-se levar pelas incertezas e em pouco tempo casaram-se.

Depois de dois anos de convívio, as coisas começaram a mudar. Perdera um bebê numa primeira gravidez, mas agora nascia o filho que tanto almejavam. O marido começou a sentir ciúmes dessa relação mãe/filho e demonstrava isso aberta e publicamente, deixando-a sempre constrangida.

Depois, veio a fase em que ele saía mais vezes e ela ficava cuidando da criança. Quando o bebê tinha somente quatro meses, ficou grávida novamente. Uma gravidez difícil, que terminou depois de três meses com muita dor. Vieram mais dois filhos e a relação do casal passou a ser ainda mais turbulenta.

O tempo passava rápidamente e os afazeres eram tantos, que não deixavam a moça pensar muito o que estava sendo sua vida. Ela, que jurara ser feliz, vivia uma vida que só não era tão vazia e triste, pela presença dos filhos. O sonho que tão lindo começara, estava virando um grande pesadelo. Era a história invertida: o príncipe virou sapo!

Num dia em que se sentia extremamente melancólica, a moça fez um novo juramento: assim que os filhos caminhassem com as próprias pernas, iria se separar desse homem que depois de tantos anos de dedicação, lhe dera em troca traições, solidão, desespero e decepções. Duvidava da coragem, que deveria reunir para este gesto. Seria ela capaz? Não perca a parte final dessa odisséia

domingo, 3 de agosto de 2008

A moça na janela. Crônica por Edna Costa

Sempre que ele olhava para a janela, via a moça triste a suspirar. Que sombrios pensamentos teria ela agora, perguntou-se o jovem? Sabia da sua historia e sentia pena ao lembrar. Ela tinha o olhar perdido e a expressão carregada por toda dor que passara. Quem desconhece a dor do amor? Do amor que machuca e deixa marcas para a vida toda? O amor bandido não faz distinção entre moça feia ou bonita e ela descobriu isso ainda bem jovem.

Era bonita e vestia-se modestamente, mas com bom gosto. Tinha longos cabelos castanhos que caiam como cascatas em cachos sobre os ombros. Os olhos castanhos e profundos realçavam a pele muito alva e sedosa. A boca delicada era rosada naturalmente, mas ela a contornava com batom quase do mesmo tom. Quando falava era cativante e todos gostavam muito dela.

Assim que ela o viu pela primeira vez, apaixonou-se. Tinha dezoito anos, muitos sonhos e seu coração
ansiava encontrar um príncipe encantado. Disse para a amiga que a acompanhava: vou me casar com ele! A amiga sorriu com certo deboche, pois sabia que o rapaz tinha namorada firme. Avisou-a e ela não fez o menor caso, como se não tivesse escutado.

Outras vezes que o viu, notou que ele a olhava com interesse também. Eram tempos mais pudicos e ela não entendia como ele, namorando firme, mostrava interesse por outra garota que não a noiva. Enfim chegou o dia em que ele a convidou para passear e ela com o coração acelerado e com alguma culpa aceitou. O amor às vezes nos faz agir como tolos e por ele perdemos a razão.

Passearam por uma praça perto de sua casa, falando de banalidades; quando ele pegou suas mãos, disse que estava apaixonado e que se ela o aceitasse largaria tudo para ser feliz ao seu lado. Logo pediu permissão para seu pai para namorá-la e começaram a fazer planos para o futuro. Ele mostrava-se apaixonado, faziam um belo par e estavam felizes. Já se passara quase dois anos quando ficaram noivos e marcaram a data do casamento.

Mas o jovem bonito era volúvel e, mais uma vez,
envolveu-se com outra sem que ninguém soubesse. Quando deram pelo fato, a jovem já estava grávida e com o pai dela nos calcanhares dele. Naqueles tempos ou casava ou morria e ele optou pela lógica. A moça da janela não suportou; sofreu um colapso nervoso tendo que ser internada num hospital onde passou alguns dias em completa alienação.

Quando voltou para casa, sua vida nunca mais foi a mesma. A ingenuidade e a alegria de viver esvaiu-se, juntamente com a decepção que sofrera. Nas noites mornas de céu enluarado e estrelas faiscantes, debruçava-se na janela com ar triste e olhando a cidade, chorava. Mas a vida tem que seguir adiante. Que peça mais o destino pregou na moça da janela? Ah! Isso já é assunto para uma próxima crônica, que vocês poderão acompanhar na próxima semana.